Durante pandemias, assim como nas guerras, o funcionamento normal da sociedade é comprometido. Quando isso ocorre, o foco passa a ser a manutenção do funcionamento de setores estratégicos e indispensáveis à vida. Nesse contexto, o fornecimento de alimentos é imprescindível.
O termo “segurança alimentar” pode ser analisado a partir de diversas dimensões, desde aspectos sociais, em que se refere a garantia de acesso a alimentos de qualidade a toda população no combate a fome, em situações de posicionamento comercial no mercado externo, em que se pode inserir barreiras econômicas utilizando aspectos químicos e biológicos como argumentos para a recusa de um produto, e até em situações de guerra, em que um país que não possui autossuficiência alimentar se torna vulnerável. Assim, para garantir a segurança alimentar, é necessário que os alimentos estejam disponíveis em quantidade, qualidade e regularidade adequada a toda a população.
No contexto atual, do coronavírus, estamos colocando em xeque a primeira dimensão. E nesse quesito, temos quantidade suficiente e qualidade adequada, o que é colocado em questão é a regularidade de acesso da população. É nesse sentido que o paradoxo entre parar e não parar ganha contornos dramáticos na ótica do agronegócio.
A discussão sobre parar ou não parar tomou conta dos noticiários e de todas as rodas de conversas. A problemática está principalmente na relação entre a quantidade de mortos e os custos econômicos, frente ao distanciamento social. A questão se agrava quando especialistas de renome se posicionam de forma distinta frente à situação. Nesse cenário, temos duas correntes predominantes, e ambas possuem vantagens e desvantagens:
Os que defendem “parar”: Baseados nas diretrizes sugeridas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e nos exemplos de China, Itália e Espanha, alegam que a forma mais eficiente de se combater a propagação do Coronavírus (Covid-19) é via o distanciamento social (e isolamento social e quarentena para os infectados).
Vantagem: Essa atitude reduziria a velocidade e achataria a curva de propagação, não levando o sistema de saúde ao colapso. O resultado seria uma quantidade de vítimas fatais pequena.
Desvantagem: O custo econômico pode ser elevado, com falências e desemprego generalizado, levando em seguida para uma recessão econômica.
Os que defendem “não parar”: Estes se posicionam tomando como fundamento os impactos econômicos. A interpretação é que a suspensão do funcionamento normal de muitas atividades produtivas durante o período de distanciamento social pode custar a viabilidade de muitas empresas e negócios e resultar em uma quebradeira generalizada, com o aumento do desemprego. E esta situação, por sua vez, pode levar ao sofrimento de muitas famílias via dificuldades econômicas, com aumento de problemas sociais (Fome e violência, por exemplo).
Vantagem: As empresas continuariam funcionando e os empregos seriam preservados, mantendo assim o poder de compra atual da população.
Desvantagem: O custo humano pode ser catastrófico, com a morte de milhares de pessoas.
Porém, esses dois posicionamentos possuem algo em comum: Setores estratégicos não podem parar.
Nas duas situações colocadas (Parar e não parar), uma coisa é consenso: Durante a pandemia, alguns produtos e serviços precisam continuar funcionando. Entre esses, o agronegócio está em destaque, pois você pode parar de fazer muitas coisas, mas não pode deixar de comer. E aqui entramos em uma questão muito importante e complexa: O impacto de um possível desabastecimento de alimentos.
Quando falamos que o Agro não pode parar, significa que toda a cadeia que envolve a produção de alimentos (Agricultura e pecuária, por exemplo) e logística para esses produtos chegarem nas prateleiras dos supermercados precisa estar funcionando de forma segura. Isso quer dizer que o produtor do agronegócio, que está lá na base, precisa ter garantias de que toda a cadeia estará funcionando e de que ele terá para quem vender.
Portanto, nos referimos inclusive aos produtores que terão de ter sua produção realocada para novos clientes, como aqueles que foram impactados pelo fechamento de bares, restaurantes e escolas, por exemplo. Ao mesmo tempo, o transportador (caminhoneiro) precisa ter garantias que encontrará ao longo do percurso postos de combustível, restaurantes e hotéis funcionando, por exemplo. E assim por diante, até o produto chegar e ser vendido em pontos de venda, como supermercados e farmácias.
Então, o que aconteceria se o Agro parasse? O primeiro impacto seria o aumento generalizado dos preços, ou seja, inflação. Essa iria acelerar até alcançar níveis absurdos, como os observados no Brasil na década de 1980 (Hiperinflação), que é um pesadelo para quem a conheceu. Aqui, o seu dinheiro começa a perder poder de compra de forma acelerada. O segundo evento seria o desabastecimento das prateleiras, e aqui chegaríamos em um ponto crítico, descobriríamos que não comemos dinheiro, e a fome começaria a ser um problema factível. Do desabastecimento para o caos o caminho seria bem curto.
Então devemos liberar tudo e voltar ao normal? Também não. Devemos ter em mente que os produtores e todos os componentes da cadeia de produção e logística precisam estar saudáveis para que os alimentos continuem chegando nos supermercados e na casa das pessoas. Assim, o funcionamento desses estabelecimentos de suporte (Postos de gasolina, restaurantes e hotéis, por exemplo) precisa ser personalizado e seguro.
Mas se as pessoas não estão trabalhando e as empresas não estão funcionando, de onde vamos tirar dinheiro para manter os setores estratégicos viáveis e funcionando? Como vamos financiar a demanda?
E se toda a sociedade dividir a conta? Quais seriam as vantagens e desvantagens? E o mais difícil ainda: Como isso seria feito? Essas são as principais perguntas quando falamos em uma solução que seria dada pelo equilíbrio. Uma saída que está sendo adotado em outros países que estão sofrendo com a pandemia do Coronavírus é a intervenção do Estado. Nesse sentido, os governos estão utilizando ferramentas e mecanismos exclusivos a eles para garantir:
Poder de compra à população mesmo sem trabalhar: Aqui, a principal proposição é uma renda mínima universal, que seria garantida aos indivíduos que estão desempregados, que possuem trabalho informal e aos microempreendedores individuais. Está em percurso uma proposta de R$ 600,00 por pessoa até o máximo de R$ 1.200,00 por família, durante um período inicial de três meses;
Viabilidade das empresas mesmo sem funcionar e faturar: No caso das empresas, as propostas em discussão envolvem redução de impostos, postergação de faturas e liberação de linhas de crédito para financiamento dos custos;
Continuação da produção dos setores estratégicos: Nesse escopo, as sugestões de políticas são de criação e disponibilização de linhas de crédito específicas para garantir e até aumentar a capacidade produtiva destes produtos. Além disso, de inserção de setores de suporte na categoria de essenciais, como os postos de gasolina, restaurantes e hotéis localizados em rodovias.
Revela-se, de novo, como em muitas outras situações de dificuldades pelas quais o Brasil e o mundo passaram, a importância do produtor rural para a manutenção do bom funcionamento da sociedade. É preciso valorizar mais as mulheres e os homens do campo! E mais do que isso, garantir que eles exerçam com maestria o seu dom!